quinta-feira, 17 de abril de 2008

Des

Alexandre salta; é o tempo de avesso. Só sabe isso: saída. Ele não é - sou? - culpado, até onde dá pra adivinhar. No máximo um desinocente: chama azul com línguas alaranjadas. Não quer não quero estar ao alcance, galopa-se pra isso: o homem que cavalga o furacão, sorriso. Olhos nas costas, calafrios: nunca longe, ao esticar de uma unha talvez um toque. Pernas de alfinete são apoio; ele cospe o cabelo do rosto. Quando os olhos caem, sente: uma lágrima que sobe aflita desde o joelho, o mundo aformigado não o vendo. Se perde um segundo - é tão longe assim, tudo? - e se perde. As mãos se aranham sobre ele, rede de aço, tenta, sai, agora, meu deus! Respira o gelo - acho que não dói - e ensaia um disparo: tropeçou no céu como se ouvisse música, o mergulho ávido, já visto: banana na rua, sem paz. Abrigo bacana, só (des)mancha.

terça-feira, 8 de abril de 2008

Palestra

Caminhão de tulipas; se reproduz por vivissecção assistida, exibicionista e caridosa. Você diz – não diz? – que me inaugura, não é mesmo? suas mãos sobre as minhas são teias de morte e ardência, e é assim mesmo que eu gosto de nós dois. Nossos olhos – explodindo em bicromátides.

É, eu sou... Será quê? Sim. Seu escritorzinho, só seu, com meu lápis quebrado apontando vagaroso enquanto meus olhos se pregam no seu cabelo, muito mais nos fios fora do lugar. As cadeiras em que nós sentamos – elas são aquilo de macio que existe.

A voz em volta se acarpeteia, enrola. São os sussurros gritalhões que fazem com que eu me sinta em casa. Chegam.

São elas e os outros, são eles e nós. As mãos juntas suam, um pouco mas incômodas. Se fala, se fala. A literatura é o avesso do ovo de Colombo, é isso. Os artesãos das palavras, cavando uma saída de tudo que se faz real.

O interesse se alarga: é uma poça inequívoca, meus pés pegajosos e enlameados me arrastam, desagradáveis, horríveis: sua mão torce meu pulso e me puxa, o abismo-redemoinho é nosso rival, boca de dentes translúcidos.

A intrusa é aquela que todos acolhem melhor que o que s’espera, a espiã não vem do além; os corações se aquecem com sua presença, princesinha. Nós assistimos ao falar, às instruções: três doses de maracujá, uma metralhadora carregada de granadas e dois tiros na testa: está pronto o seu artista.

Eu quero, diga-me, eu quero, quero que escoe sobre mim a poesia e a poesia e a poesia, todas elas, juntas, lambendo meu corpo insinuantes – nada insinuante, explícitas, pornográficas, escatológicas, absurdas, um rio de sangue coberto de pus: essa é a poesia que apetece aos meus (quanta beleza!, quanta certeza!) leitores, os próprios.

Eu sou rijo, sou estante, sou vermelho: sou o ouvido que tenta não ignorar mas que quando te vê se perde, as palavras preciosas passarinham para longe, a rica arte discreta que queremos reproduzir, tudo no ar, sólido: eu esqueço tudo e vejo você.